sábado, 26 de março de 2011

Síndrome de Betina

   Antes eu defendia partidos políticos. Desisti.  É tudo sempre a mesma coisa, tal e tal é o melhor, mais justo com o povo, com a verdade, com a ética.
   Antes deste antes aí eu defendia as religiões. A mesmíssima conversa: a minha é que é a verdadeira, a minha é que tem como cabeça Jesus Cristo.
   As coisas mudam, a vida muda e essas mudanças na vida são muito complicadas porque envolvem opiniões, conceitos, valores que sempre foram considerados verdadeiro: exemplo é a mentira, quando somos crianças a Mentira é um pecado, um mau irreparável, quando a gente cresce a Mentira se torna um recurso, para suavizar, para enganar, para justificar mas sempre com o mesmo fim, para explicar uma se diz outra, para se justificar esta outra se arranja outra e assim até que no fim a bola de neve está insuportavelmente grande e a verdade aparece.
   É claro que não me arrependo de ter apoiado tal partido e tais religiões, serviram para o meu crescimento pessoal, todas as vezes que eu pensei que estava indo pelo caminho certo e descobri que estava num beco sem saída dos embustes. Acho que há mais honestidade nos bordéis do que nas Igrejas e Partidos Políticos, porque indo a um bordel se sabe muito bem o que se vai encontrar, nos dois outros existem apenas as aparências e no fundo, no fundo, o que se vê é a busca desenfreada e cruel pelo poder e pela riqueza.
   Eu já fui homofóbica, daquelas de dizer que a homossexualidade é uma coisa antinatural, mas um colega meu me fez ver que eu estava errada e que por serem pessoas diferentes não queria dizer que não tivessem o direito de viver. É. E isso se estende às pessoas com necessidades especiais. Quem era eu para escolher quem podia viver ou não? sim, porque, à medida que eu discriminava as pessoas eu as matava aos pouco pois lhe negava o direito de trabalhar, estudar, namorar, sonhar, amar, ser feliz.
   Eu ia ao meu passado, eu me agarrava às coisas que meus pais me ensinavam para justificar meus erros, minhas arengas, minhas razões, isso invariavelmente todo dia 1° de Janeiro, ia passear pelo bairro de Heliópolis, onde passei parte da minha infância, também numa forma de me despedir daquela parte da minha vida. Foi boa, mas passou, e eu não podia mais continuar vivendo e acreditando em certos valores que não eram assim tão importantes. Depois chegou a parte da revolta, a adolescência trancafiada por barras de ferro do governo militar, você não podia pensar, não podia falar, não podia ter suas próprias idéias sem correr o perigo de desaparecer e reaparecer morto nos arredores da cidade. Gostei do Partidão, li Marx, achei Lenin um gato, mas tudo calada, se falasse...nem pensar! Daí o tempo foi passando, passando, passando e eu me descobri uma cética de carteirinha, pior do que os detetives do CSI: não acreditava em mais nada do que via e ouvia e aprendia realmente a ler entendendo, criticando e não passando os olhos por cima das letras.
   Deixei todas estas coisas velhas e me descobri lutando por uma coisa: o direito é para todos, como o dever também é. Os que precisam de nossa compreensão e apoio são os excluídos, aqueles aos quais a gente sisuda e mal encarada diz: "Você não!"

4 comentários:

  1. Betina é a personagem principal do livro "tempo e Memória" de Ivonete Xavier.

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  2. Lindo Ilda, até chorei!
    Vc escreveu com a alma, isso foi maravilhoso!

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  3. Muita propriedade na sua palavra, acho que como eu me identifiquei com "Bella Toscana", vc se identificou com "Tempo e Memória"...
    É sempre bom mudar e admitir esta mudança e ainda mais praticar esta mudança. Realmente ir ao fundo de si para resgatar o que ficou mal resolvido é o santo remédio para estes problemas existenciais, e daí trabalhar para seguir em frente, corrigindo na vida diária o que, mal resolvido, volta para assombrar o individuo. Então é possível voltar a viver, respeitando as diferenças que existem e conviver com elas, aceitar as pessoas como elas são ou ajudá-las a mudar se elas estiverem decididos a isso."Viver e deixar viver", já dizia o velho Bond... James Bond.

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  4. Gostaria de saber escrever assim! Beijos.

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